Dentre os temas em discussão na sociedade ocidental, talvez o medo da morte e da velhice sejam os mais apavorantes. Estes medos certamente favoreceram em grande medida a corrida pelo desenvolvimento de tratamentos que retardam os efeitos do envelhecimento ou pelo menos promovam o disfarce.
Observando-me defronte do espelho percebo que a cada dia que passa, mais e mais cabelos brancos brotam de minha cabeça, que minha pele perde a elasticidade e que os meus músculos já não correspondem aos mesmos desafios de outrora.
Contemplo-me e me sinto bem. Percebo a vida como uma caminhada e cada dia como uma dádiva recebida e pela qual devo agradecer constantemente. As vezes digo para mim mesmo que envelheci antes dos outros porque consigo decodificar as armadilhas pelas quais passamos e que nos enfraquecem quando acreditamos que a velhice ou que a morte são motivo de desespero.
Imagino a morte e a velhice como grandezas vetoriais que caminham em sentidos opostos para se encontrarem em um ponto qualquer na curvatura espaço tempo.
Caminhar para a velhice é, necessariamente, caminha para o que chamamos de morte. Tendo esta consciência decidi solicitar a morte que me espere no ponto em que está e que eu, a passos de tartaruga, caminharei para ela, ou, na velocidade da vida, saltaltarei por ela.
Quando ignoramos a morte e irresponsavelmente conduzimos nossas vidas, paramos no caminho e nos entregamos precocemente ao fim.
Quando negamos o processo de envelhecimento como acúmulo de experiência de vida, condenamos os nossos semelhantes ao isolamento como se envelhecer fosse castigo.
É bom sorrir para a juventude, mas é melhor ainda, sorrir para a velhice, porque são os mais velhos que não ficaram parados esperando a morte chegar, antes caminharam ao seu encontro e reafirmaram para ela que são vencedores.
Ao esquecer a morte, deixamos que ela acelere sua velocidade ao nosso encontro. Ao negar a velhice que há em nós, olhando apenas na direção contrária ao sentido da vida, aceleramos ao encontro da morte.
Enquanto a vida caminha para o futuro, a morte caminha para o passado.
Caminhar para o futuro é percorrer a espiral da vida no sentido ascendente. Nesta espiral, a morte nada mais é do que um vácuo de descontinuidade que separa as duas pontas do caminho. Vácuo ora mais largo, ora mais estreito. Ao acelerar a vida, saltamos facilmente no vácuo e encontramos a outra ponta do caminho. Ao retardar a vida relativizamos o tamanho do vácuo em nosso desfavor.
Viver é seguir em frente, morrer é retroceder. Seguindo em frente, saltamos de uma vida para outra vida. Passando pela morte, não permanecendo nela. A morte é o arranhado no disco de vinil. A vida é todo o disco.
Belíssimo ponto de vista professor!
ResponderExcluirVejo esta como uma questão de infinitas cogitações. Enquanto muitos se abstêm deste tipo pensamento, outros aspiram conhecimentos ou até mesmo lhe garantem demasiado grau de relevância.
É sem sombra de dúvida um assunto que vai muito além do entendimento de bem e mal. Muitos buscam amparo da religião para saciar suas dúvidas e questionamentos, mas acredito que nem mesmo esta ofereça luz suficiente para iluminar o denso e escuro caminho que é a morte.
De certo, só saberemos o que há após a morte, quando morremos. No entanto, não estamos aqui, VIVENDO, para pensar exclusivamente neste aspecto, muito menos viver por viver, ser ter algo que nos motive, que nos incentive e nos faça feliz. Devemos existir por alguém, para alguém e por nós mesmos...
O trecho abaixo, de Epicuro, em "A Conduta na Vida", traz seu o ponto vista relativo a este tema. É muito interessante, e vale à pena ler:
“[...]
Habitua-te a pensar que a morte não é nada para nós, pois que o bem e o mal só existem na sensação. Donde se segue que um conhecimento exato do fato de a morte não ser nada para nós permite-nos usufruir esta vida mortal, evitando que lhe atribuamos uma idéia de duração eterna e poupando-nos o pesar da imortalidade. Pois nada há de temível na vida para quem compreendeu, nada haver de temível no fato de não viver. É, pois, tolo quem afirma temer a morte, não porque sua vinda seja temível, mas porque é temível esperá-la.
Tolice afligir-se com a espera da morte, pois trata-se de algo que, uma vez vindo, não causa mal. Assim, o mais espantoso de todos os males, a morte, não é nada para nós, pois enquanto vivemos, ela não existe, e quando chega, não existimos mais.
Não há morte, então, nem para os vivos nem para os mortos, porquanto para uns não existe, e os outros não existem mais. Mas o vulgo, ou a teme como o pior dos males, ou a deseja como termo para os males da vida. O sábio não teme a morte, a vida não lhe é nenhum fardo, nem ele crê que seja um mal não mais existir. Assim como não é a abundância dos manjares, mas a sua qualidade, que nos delicia, assim também não é a longa duração da vida, mas seu encanto, que nos apraz.
Quanto aos que aconselham os jovens a viverem bem, e os velhos a bem morrerem, são uns ingênuos, não apenas porque a vida tem encanto mesmo para os velhos, como porque o cuidado de viver bem e o de bem morrer constituem um único e mesmo cuidado.
[...]”
UM FORTE ABRAÇO!!
Do seu amigo Jorge Júnior.